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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CARLOS FERREIRA

( Rio Grande do Sul – Brasil )

 

Carlos Augusto Ferreira (Porto Alegre, 1844 — Rio de Janeiro, 1913) foi um escritor, poeta e jornalista brasileiro.

Foi poeta membro da Sociedade Partenon Literário e aprendiz de ourives, saudou em verso a D. Pedro II[, no Theatro São Pedro, quando o imperador veio a Porto Alegre, em 1865, após a rendição de Uruguaiana.

Admirado com o talento do jovem, D. Pedro II quis conhecê-lo pessoalmente e lhe propôs uma viagem de estudos no Rio de Janeiro, custeada pela Corte. Ferreira aceitou prontamente o convite, desistindo de seu noivado com Amália Figueiroa. Tendo recebido do imperador uma bolsa, matriculando-se na Faculdade de Direito de São Paulo, Ferreira porém, pouco antes de se formar, em 1870, declarou-se republicano e abandonou os estudos. Dedicou-se ao jornalismo, trabalhando no Correio Paulistano, onde publicou crônicas semanais.
Mudou-se para Campinas, onde fundou, com Querino dos Santos, a Gazeta de Campinas e depois o Colégio Benjamin Constant.

Como poeta publicou: Cânticos Juvenis, 1867; Rosas loucas, 1868; Alcíones, 1870; Redivivas, 1881; Plumas ao vento, 1908.

Fragmento de biografia extraído de https://pt.wikipedia.org/

 

ROMANTISMO / seleção e prefácio Antonio Carlos Secchin.  São Paulo: Global, 2007.  (Coleção roteiro da poesia brasileira. Direção: Edla van Steen.)                           Ex. bibl. Salomão Sousa

 

ROSAS LOUCAS

Ó rosas loucas que o verão bafeja,
—Odaliscas gentis dos sonhos grandes!
Deixai que eu passe junto a vós cantando
— Ave saudosa que rolou dos Andes! —

Sou moço e sonhador. Minh´alma triste
Sente o espinho cruel do amor mundano;
E no entanto em meu peito as crenças brincam
— Garças brancas perdidas no oceano!

Minha lira febril soluça e goza.
Amo Deus, a mulher a liberdade,
Os raios do luar bebem-me as lágrimas,
E eu bebo a luz do sol da imensidade!

Alvoradas gentis da minha terra
Cujo pranto de amor banha-me a fronte,
Rasgai as sombras deste céu da pátria,
Suspendei as cortinas do horizonte;

Mostrai-me a luz das glórias peregrinas,
Os louros do provir da mocidade...
Sou moço e sonhador, minh´alma é grande,
Amo Deus, a mulher e a liberdade!

E tu, visão sublime dos meus sonhos,
— Chispa de luz de peregrino astro —
Deixa que eu goze num só beijo a glória
Sobre o teu liso colo de alabastro!...

Ardente inspiração das frontes jovens
Vem sonora embalar meu peito aflito...
Eu quero — ave de amor — soltar meus cantos
Pelos doirados mundo do infinito!...

Rosas loucas do ermo! eu vos adoro
Doces filhas da lúcida quimera!
Oh! deixai-me cantar! Dentro em minh´alma
Brinca um raio do sol da primavera!...

 

                           S. Paulo, 1869. 
Rosas loucas (1871
)

 

O BAILE DAS MÚMIAS

(Impressões da meia-noite)

Meia noite!... O triste bronze
Suspirou saudoso já...
Além rangeram as campas,
Alguém gemeu... Que será?
Na ogiva do campanário
Negro mocho solitário
Soltou sangrenta canção...
E a brisa os ares rasgando
Crava os lábios, blasfemando
Nas entranhas d´amplidão!...

Tudo é silêncio... Nos ares
Feio inseto perpassou;
Soam gritos, geme o eco
Como um crânio que estalou!
Quem é? quem sofre a esta hora?

Que condenado é que implora?
Serão fantasmas do horror?
Serão almas dispersadas
Das tumbas afugentadas
Inda nas febres do amor?

Somem-se os astros nublados,
Vela-se a face dos céus,
Surgem caveiras de múmias
Das fendas dos mausoléus!
Como alâmpadas funéreas
Refulgem chamas aéreas
Pendentes do salgueiral...
No rouco clarim dos ventos
Tremem profundos lamentos
De uma lascívia infernal!

Meia noite! hora de sangue,
Hora de febres fatais,
Hora em que gemem saudades
Dos tempos que não vêm mais;
Quando os pálidos precitos
Requeimam lábios malditos
Em taças negras de fel.
Quando as bocas dos finados
Soltam gritos compassados
Pedindo sangue ao bordel!...

Silêncio! O baile dos mortos
Vai agora começar!
Das tumbas surgem gigantes
Pra o tremendo valsar...
Já soberbos se agitaram
Gênios que outrora habitaram
Neste mundo como nós;
Por seus cabelos poeirentos
Os vermes passeiam lentos
— Requintado adorno atroz!...—

Em torno à torre da igreja
onde reza o furacão,
Negreja o bando agoirento
Das aves da escuridão.
Erguidos, ébrios, sedentos
Os fantasmas macilentos
Arrastam trêmulos pés...
E o morcego agita as asas
Por sobre as lápides rasas
Como o arcanjo do revés!...

Rompe a orquestra, o baile rompe,
A tempestade assobia;
Giram nas valsas os vultos,
Arde a febre, vive a orgia!
Bem como um bando de gralhas
Passam na brancas mortalhas
Os convivas do festim;
E as grutas fundas, rasgadas
Respondem com gargalhadas
Ao som da orgia sem fim!...

"Avante! avante consórcios!
Gênio das trevas, dançai!
Bebei nos crânios quebrados
Rubro licor, e folgai!"
Então, num vórtice enorme
Gira doida a massa informe
Dos convivas sepulcrais...
Reboam, sobem os gritos,
Fumegam lumes malditos
Nas grimpas dos pinheirais!

Dançam as hostes dos gênios...
Byron dança — o colossal
Gigante das tempestades
Segredando ao vendaval!
Grande, imenso, redivivo
Shakespeare dança altivo
Enchendo a vasta amplidão...
Do mar ao surdo ribombo
Dança orgulhoso Colombo
Partindo os raios coa mão!

E o Dante — pálido, imenso —
Quebrando as campas cos pés,
Pelos cabelos sacode
Do inferno as fúrias cruéis!...
E depois, funéreo... ingente
Salta Goethe onipotente
Com mais dois vultos além...
Silêncio, abismos! — são eles...
— É Fausto e Mefistófeles
Que ao baile voam também!...

E as damas fúnebres dançam
Com redobrado fragor!
Com Petrarca dança Laura,
Com T asso dança Eleonor!
Romeu conduz Julieta...
Com Camões — láurea do atleta,
Vem Catarina ao festim.
E sobre as frias alfombras
Saltam ainda mil sombras
Dessas falanges sem fim!

Ruge a orgia. Tristes, graves,
Fendendo as ondas de pó,
Homero e Milton — dois cegos —
Não dançam, não, surgem só!
E depois, grandes, risonhos,
Em negros corcéis medonhos
Dos séculos rompendo o véu,
Ambos eles transportados
Vão como que arrebatados,
Cravar estrofes no céu!...

Redobra o baile das múmias,
Gritam as ondas além...
Passam, repassam as sombras
Em furibundo vivem!
Soam lúgubres trombetas...
Debatem-se as nuvens pretas
— Feras do espaço a rugir! —
Das fauces rubras do abismo
Rompe, salta o cataclismo
Que ameaça o baile extinguir!

"Bravo! Bravo!"  diz o vento;
Grita o trovão — "Muito bem!"
Os ciprestes batem palmas
Como aplaudindo também...
Soa o rufo... A festa aumenta...
Deus sobre um raio se assenta
E vem nas tumbas pousar!
Batem nas loisas os crânios,
Somem-se os vultos titânios
Arde em fogo o lupanar!...

.......................................

E as nuvens pávidas, trêmulas,
Deitam depressa a correr...
Medroso o trovão ao longe
Vai gaguejando morrer...
E os morcegos espantados
Fogem, correm dispersados
Numa carreira sem fim;
E sobre as torres pousadas
As corujas debruçadas
Espreitam esfomeadas
Os destroços do festim!...

São Paulo, 1867

                     Rosas loucas (1871)

 

*

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Página publicada em maio de 2022


 

 

 
 
 
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